¬ Os investimentos e a linguagem do mercado financeiro



Os bancos são grandes atravessadores. Negociam uma mercadoria chamada dinheiro. Buscam esse dinheiro com quem não o utiliza para emprestar àqueles que necessitam para consumo (famílias), ou investimentos e capital de giro (empresas). Esses recursos podem ser adquiridos pelos bancos via poupança e CDB's, por exemplo. Ou seja, nós emprestamos dinheiro aos bancos e eles nos pagam juros, que são cobrados de seus clientes na ponta (empresas e outras famílias). Nos casos citados, CDB e poupança, o banco compra o meu dinheiro, já que se compromete a pagar um juro por eles, e o repassa na ponta para quem achar mais lucrativo. Eu, como poupador, não sei pra onde vai o dinheiro e, na verdade, nem estou tão preocupado já que garanti o meu rendimento no ato da aplicação. Isso coloca o banco na condição de atravessador.

Mas, a atuação dos bancos não se restringe a essas 2 operações. Quando o assunto é dinheiro trabalham em áreas bem diversas. Além da poupança e dos CDB's podem, por exemplo, pegar nosso dinheiro para aplicar em dólar (fundos cambiais), em ações na Bovespa (fundo de renda variável ou fundo de ações), em imóveis (fundos imobiliários), ou ainda emprestar nosso dinheiro para o governo (fundos de renda fixa e fundos DI) – veja no final do artigo um glossário. Isto é, as possibilidades são diversas, e cada investimento que ele faz com nosso dinheiro dá um nome específico a um tipo de fundo de investimento, facilitando a identificação de onde a “grana” está sendo aplicada.

Notem que, neste último caso (fundos de investimento), o banco atua não como um atravessador, pois não compra meu dinheiro. É um intermediário, pois me conduz diretamente ao outro interessado, cobrando uma taxa por isso, a taxa de administração ou corretagem. Em alguns casos, como no fundo de ações, cobra também uma taxa de performance, ou seja, se o ganho com as ações for razoável ele me exige, além da taxa de administração, um adicional, uma performance pelo bom gerenciamento do meu dinheiro.

Comparemos um feirante a um banqueiro e, assim, nos coloquemos no ponto de vista de um vendedor de laranjas ou de dinheiro (investidor). Ao comprar minhas laranjas (dinheiro) e revendê-las para clientes diversos ele atua como atravessador, pois comprou-as de mim por um preço (juro) e escolhe pra quem vender, quando vender e a que preço vender, já que dependendo do cliente o risco pode ser maior ou menor pra ele (cheque especial, capital de giro, cartão de crédito, leasing, empréstimos consignados etc). Portanto, se tudo der errado,  o prejuízo é dele, pois eu tenho garantido o meu rendimento, já que 'recebi' um valor pelas laranjas.

Agora pensem na seguinte situação. Eu tenho laranjas (dinheiro) e peço ao feirante que me coloque em contato com um restaurante específico, pois quero direcionar minha venda de laranjas pra ele. O feirante (banco) pode me cobrar uma taxa por fazer essa ligação, atuando nesse caso não como atravessador, mas como um intermediário. Surgem aqui os fundos de investimento. Neste caso, como eu escolhi para quem vender minhas laranjas (meu dinheiro), se minha negociação der errado, ou se o preço ficar aquém do que imaginava, o prejuízo é meu e o banco não me devolverá a taxa de administração.

De forma mais resumida ainda. Quero vender o meu carro e tenho duas opções: 1) ou o vendo pra uma agência de veículos que me paga um valor por ele (atravessador) - se ela não conseguir vendê-lo depois é problema dela pois já estou com o dinheiro na mão; 2) ou aviso a mesma agência que tenho um carro pra vender e que ela me arrume o cliente. Ela pode aceitar esse acordo e me cobrar um percentual pra fazer isso (intermediário). Neste caso, quando ela me indicar um cliente ganha o seu percentual, mas se o cheque do comprador do carro voltar o problema, prejuízo, é meu. A corretagem não será devolvida pela agência.

Portanto, depósitos na poupança, CDB, LCI (letras de crédito imobiliário), LCA (letra de crédito agrário) e títulos de capitalização tornam o banco um atravessador. Depósitos em fundos de investimento fazem dele um intermediário. Por isso, em fundos de investimento eu compro uma cota, um pedaço do fundo (que nada mais é que um pedaço da Petrobras, um título do governo etc). O banco não tem obrigação alguma de me dar algum rendimento. Recebe sua taxa de administração e só. Dali pra frente todo o risco é meu, e o meu lucro dependerá do comportamento do ativo que comprei, podendo me levar, inclusive, ao prejuízo.

Então, olhando para a captação que os bancos fazem via CDB vemos que o princípio é o mesmo da poupança. Pagam, por exemplo, 0,9% ao mês no CDB e emprestam esse dinheiro às famílias e empresas a 3%. Essa diferença (2,1%) é o spread bancário. Portando, esse termo é usado para mostrar a diferença entre o que o banco paga ao captar recursos (poupança, CDB's etc) e o valor que ele cobra.

Acontece que essas aplicações tem um jargão próprio. Ao negociar um CDB, LCI ou LCA recebemos um percentual que é uma parte do CDI (certificado de depósito interbancário). Esse CDI, também chamado de DI, nada mais é que os juros que os bancos cobram uns dos outros para fazerem empréstimos entre si.




Assim, se emprestamos dinheiro ao banco ele nos paga um percentual da taxa de juros que eles negociaram com outros bancos ao longo do dia, o tal do CDI. Logo, se o CDI ficou em 10%, o Santander me paga um percentual disso quando empresto o meu dinheiro. Se o Itaú tivesse emprestado pra ele receberia os 10% de juros no ano. Todavia, eu recebo apenas uma parte disso, por exemplo, 80%. Assim, o meu rendimento será de 80% do CDI, isto é, 8% no ano. Assim, em linhas gerais, muitos dos rendimentos que fazemos enquanto aplicadores se comportam como no desenho abaixo:


O único 'investimento' com rentabilidade determinada pelo governo é a poupança. Todos os outros dependem das negociações que fizermos com os bancos enquanto atravessadores. Assim, a remuneração da caderneta é definida por lei em 0,5% no mês (6% ao ano) + a tal da TR, uma espécie de índice de inflação. Há, ainda, outra determinação do governo com relação aos depósitos na poupança. Os bancos devem, obrigatoriamente, emprestar 65% dos recursos depositados na caderneta para o financiamento da habitação e obras de saneamento. Ou seja, acaba sendo uma menor parte direcionada para empréstimos às famílias (consumo) e aos empresários (produção). Imaginem, então, se o rendimento da poupança fica melhor que os outros. Neste caso todos migram pra poupança e como, por lei, 65% já tem destinação específica, automaticamente teríamos uma sobra absurda de recursos para esse setor e pouco pras outras áreas da economia, como consumo e investimentos - por isso a discussão, não muito bem vinda,  em 2009 (governo Lula) em torno da taxação da poupança. O objetivo era diminuir sua atratividade para que os investidores aplicassem em outros lugares (fundos DI, CDB's, ações etc etc).

A criação dos CDB's pelos bancos visou exatamente isso, "fugir" dessa obrigatoriedade de aplicação no setor imobiliário/saneamento. O dinheiro do CDB pode ser aplicado onde o banco quiser; mas, não se arriscará muito com ele por já ter se comprometido em pagar um valor fixo ao depositante.

** Uma segurança maior é dada pelo FGC para poupança e CDB's, uma espécie de garantia de que, se tudo der errado, podemos sacar até 250 mil, por CPF e por instituição.

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Seguem alguns investimentos, suas principais características, rentabilidade e impostos a serem pagos:

Fundos cambiais: fundos que captam recursos dos investidores para aplicar em dólar. Compro um pedaço, cota, do fundo. Se o dólar subir eu ganho (subir o valor da cota), se cair eu perco. O banco não me garante nada. 

Fundos DI (Depósito interbancário): utilizam o dinheiro dos depositantes para comprar títulos do governo. Como regra, devem aplicar 95% do dinheiro em títulos públicos, pós-fixados na selic, ou seja, o ganho efetivo só se sabe no resgate, mas tende a acompanhar a selic. Os bancos que vendem estes fundos podem usar os outros 5% para comprar títulos de empresas (debêntures), CDB's de outros bancos etc. Porém, a maior parte dos recursos vai mesmo pro governo. Lembrando que a expressão genérica renda fixa significa fundos que apliquem tanto em títulos pré (fundos renda fixa) quanto aqueles que aplicam em títulos pós (fundos DI). Ou seja, o raciocínio não é tão simples, Mas, ao aplicar em renda fixa posso não garantir que a taxa, e a renda, seja efetivamente fixa. Teria que investir em um fundo renda fixa e não em um fundo DI. Ambos tem risco baixo. Porém, note que fundos de renda fixa podem ter elevado risco uma vez que aplicam em títulos que, apesar da taxa de retorno fixa, sejam arriscados. Nesse caso é o risco de crédito, ou seja, do vendedor do título não honrar o pagamento. Já no fundo DI, apesar de a rentabilidade não ser pré-fixada, está atrelada à taxa selic, o que o torna menos arriscado já que é o governo quem paga a selic. A própria Anbima faz uma distinção entre os diversos fundos DI e renda fixa, ou seja, onde eles devem investir o nosso dinheiro.

Fundos imobiliários: utilizam os recursos para aplicação em novos imóveis.

Poupança: depósito com remuneração definida pelo governo (6% ao ano, ou 6%/12 = 0,5% ao mês + TR). É a única modalidade de investimento isenta de IR (Imposto de Renda), junto com as LCI's (Letras de crédito imobiliário). Para todas as outras existe tributação de IR específica. Notem que as regras da poupança mudaram em maio de 2012. A partir desta data, os novos depósitos terão como remuneração os 0,5% am (6% no ano) caso a taxa selic fique acima de 8,5% aa. Quando a selic ficar abaixo desses 8,5% os depósitos na poupança renderão 70% da taxa selic, e não mais os 6% no ano. Com isso o governo evita que a poupança capte muitos investidores caso a selic caia bastante e torne os fundos DI/renda fixa pouco atrativos. Se a selic voltar a subir e ficar acima dos 8,5% volta a regra antiga.

 Você acha que a poupança é, realmente, um péssimo investimento? Então precisa ler isso. Veja também o artigo sobre a nova regra da poupança.

LCI's e LCA's: um bom 'substituto' da poupança é a LCI (letra de crédito imobiliário), mais comuns, ou LCA (Letra de crédito agrário). São aplicações também sem IR e taxa de administração. O banco utiliza esse dinheiro para créditos no setor imobiliário ou agrário. No entanto, a aplicação mínima pode partir de 30.000 e o dinheiro fica parado 1 ou 2 anos, dependendo do banco. É remunerada, assim como o CDB, como um percentual do CDI. Esse percentual tem oscilado entre 80% e 84% (Caixa Econômica), podendo ser maior se a quantia aplicada for superior a 120 mil. 

Títulos de capitalização: são depósitos feitos nos bancos com saque após 1 ano, em média. A remuneração dessa aplicação é a TR, sendo o valor aplicado devolvido no final do período e acrescido dessa atualização monetária (TR). A grande diferença do título de capitalização com relação à poupança é que ele não rende mensalmente e o saque só pode ser feito no final do período - quem sacar antes pode inclusive receber um % de multa. Além disso, enquanto a poupança paga 6% ao ano + TR, aqui o investidor recebe só a TR, ou seja, não recebe quase nada. Além disso, os títulos de capitalização dão direito a concorrer a prêmios: carros, geladeiras etc etc. Um engodo pra atrair as classes mais baixas, maior mercado pra esse produto, comprando assim, a custo baixo, o dinheiro por elas disponibilizado. O marketing dos bancos pra esse péssimo investimento é que o comprador do título de capitalização receberá um valor superior ao valor inicial investido, já que será reajustado pela TR (se ganhou, quando muito, 1% no ano de TR e o IPCA deu 5% já levou uma 'pancada' de 4%). Aliado a isso, dizem os banqueiros, os juros são distribuídos na forma de prêmios nos sorteios. 
 
Veja o artigo sobre os títulos de capitalização.

Afinal, qual dos investimentos acima é melhor? Essa resposta depende de 2 coisas: a) do risco que se quer correr; b) do quanto de matemática básica, e juro composto, você entende. Alguns, como os títulos de capitalização, já descartamos de cara. E, se você quer menos risco porque está preparando a aposentadoria, desaconselho bolsa de valores. Restam, portanto, títulos do governo e outros investimentos privados e seguros, como LCI, LCA, CDB; e a poupança para pequenos valores ou em momentos de selic muito baixa. A  partir daí não tem jeito, é olhar no site do tesouro direto os títulos disponíveis, as taxas que eles pagam (IR e tx. de administração), e comparar com LCI, LCA (isentas) e CDB. A comparação deve ser feita pensando sempre no mesmo prazo de vencimento, de preferência depois do terceiro ano porque a alíquota de IR é menor. Veja a seguir um pouco sobre IR em aplicações financeiras.

OBSERVAÇÃO: todo o rendimento das aplicações que falamos acima é um rendimento nominal, para sabermos do ganho real, que é o que efetivamente interessa, temos que retirar a inflação anual.

Mas ........ e os títulos públicos?? Não são os melhores investimentos atualmente?? Por que não falei deles? Selecionei 2 tipos de títulos, os com melhor rentabilidade (vencimento em 2019) para analisarmos a rentabilidade.

- Tesouro IPCA + 2019 (NTNB  princ): venc. em 2019 com juro pago de 6,10% ao ano + IPCA anual
- Tesouro pré-fixado 2019 (LTN): venc. em 2019 e juro de 12,73%

Vamos às contas:
- Tesouro IPCA: 6,1% mais inflação, projetada, em torno de 7,5% = 13,6% - 15% (IR) = 11,56% aa.
- Tesouro pré: 12,73% -15% (IR) = 10,45% aa.
Nas contas acima considerei não haver taxa de adm. pois no próprio site do tesouro vc encontra algumas corretoras que dão isenção.
Comparando agora: fiz neste ano (2016) uma LCI no Bradesco que me pagou 80% do CDI, ou seja, 11,3% aa (80% de 14,13%). Lembrando que nas LCI não há imposto de renda - a Caixa me ofereceu, para o mesmo período, 82% do CDI.  

Conclusão: por que eu trocaria um investimento com rendimento igual ao do tesouro direto se não preciso travar o dinheiro por 3 anos (lembrem que só nesse caso a redução do IR cai a 15%, se resgatar antes disso a rentabilidade piora muito)? No final de 1 ano de aplicação posso escolher outro investimento. Além disso, não esqueçam que LCI e CDB tem garantia do FGC, títulos públicos não!



TRIBUTAÇÃO E FGC

TRIBUTAÇÃO (IR, IOF e tx de admin.): Há uma tabela regressiva de IR, ou seja, quanto mais tempo o dinheiro ficar aplicado menos se paga pro governo. Isso tem o objetivo de estimular os investidores a deixar os recursos fiquem parados no banco um bom tempo:

até 6 meses = 22,5% de IR sobre o rendimento;
6 meses a 1 ano = 20%;
1 a 2 anos = 17,5%;
acima de 2 anos = 15%.

Além do IR ainda há o IOF, caso o dinheiro seja retirado antes de 30 dias, o que também segue uma tabela regressiva. Por exemplo, se sacar o dinheiro 2 dias após a aplicação paga 96% de IOF sobre o rendimento. A partir do 30º dia não há mais IOF. Além disso ainda temos as tais 'taxas de administração'. Nesse ponto vale lembrar que no caso dos CDB's, assim como na poupança, LCI e título de capitalização, ela não existe. Isso ocorre apenas nos fundos de investimento.  

FUNDO GARANTIDOR DE CRÉDITO (FGC): fundo que garante aos depositantes, conta corrente, poupança e cdb's até 70 mil reais caso o banco quebre. A devolução desse dinheiro não é por conta, mas por cpf. Assim, duas contas no mesmo banco com 250 mil cada, com o mesmo cpf, só dão direito ao recebimento de 1 delas. Já uma conta conjunta, por ter 2 cpfs, dá direito a R$250.000 de saque, 125 mil por cpf. Caso tenha dinheiro em 2 bancos, 250 mil em cada, saca o limite máximo nos dois, ou seja, 500 mil.

Veja as regras no site do FGC

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